História da Imagem

 

    A imagem original de Senhor Bom Jesus do Livramento fica no santuário (Rua Doutor Antônio Lage, 86) e é considerada uma das mais belas obras de arte sacra de todo o sul de Minas. Esculpida entre os anos de 1720 e 1750, a imagem mede, em seu conjunto, 1,90m. O grande destaque está no sangue que escorre das chagas de Jesus recoberto por numerosas pedras de rubis. A escultura é toda em cedro e não possui cabelos, para possibilitar a oferta de cabeleiras em cumprimento de promessas.
    A imagem impressiona a todos, tanto pela grandeza estética, quanto pelo misticismo. De acordo com a devoção popular, ela foi esculpida por um velho peregrino desconhecido. Ele se ofereceu para confeccionar a imagem e em troca a comunidade iria remunerá-lo da maneira que quisesse. A única exigência do homem era que todos se afastassem dele enquanto realizava o trabalho. Passado três dias, as pessoas foram até ele para ver o andamento e quando chegaram se surpreenderam; o velho havia desaparecido e deixado a imagem de Jesus Cristo do tamanho natural de um homem.Fonte: (https://www.arquidiocesejuizdefora.org.br/)

A  IMAGEM DO SENHOR BOM JESUS DO LIVRAMENTO

por Padre Elias  Saleh  Filho

 

    Extasia-se aquele que contempla a Santa Imagem  do Senhor Bom Jesus do Livramento, verdadeiro tesouro de arte e de religiosidade existente na Paróquia de Liberdade.
    Quanto mais se olha e se pensa na imagem, mais se admira,  mais se empolga! Ela impressiona profundamente tanto pela grandeza estética, quanto pelo misticismo que irradia.   Nasce  espontaneamente na alma a certeza de que ela   é  Obra-Prima de um gênio,   de um santo.

    Trata-se da  escultura, em tamanho natural, de Cristo flagelado, em pé, talvez no momento em que era apresentado por Pilatos: “Ecce Homo!”
    A escultura é toda em cedro inteiriço, numa perfeição anatômica e expressão dramática de beleza incomum. A imagem mede, em seu conjunto, 1,90 m, apoia-se unicamente no pé esquerdo e na ponta do pé direito, parecendo caminhar a custo. Tem os braços estendidos para frente, unidos nos pulsos, entregando-se ao laço das cordas. As mãos - para mim o detalhe de maior beleza  artística - pendem doloridas e suaves. Aliás, tudo  naquela imagem  é suave  e tranqüilo, exprimindo uma dor pungente, porém  íntima  e discreta. Os músculos se descontraem com extremo sacrifício, erguendo-se  a cabeça para  apresentar um rosto  de expressões exaustas, cheio de amargura e bondade. O  dorso é um  tanto encurvado, como sustentando um peso  excessivo, comprimindo-se o ventre numa respiração  custosa. A  imagem não possui  cabelos, para possibilitar a  oferta de cabeleiras em cumprimento  de promessas. Todo o abundante sangue que corre  das chagas é recoberto  por milhares de rubis, apresentando detalhes de extrema  delicadeza a imaginação, por  exemplo, algumas gotas  nos  cantos das unhas e debaixo  do calcanhar!  É de se notar  que, além  da pequena  tolha esculpida na  cintura, nada mais encobre ou completa o talhe do corpo, admirável em cada  pormenor da cabeça aos pés. A obra  foi executada por  volta  de 1720 e, segundo a tradição,  em apenas três dias. Muito acima do imensurável  valor artístico, o mistério  de sua existência na cidade de Liberdade constitui um privilégio, uma graça especialíssima  de Deus para  o povo da  vasta região do Sul de Minas.

 

Fonte: Paroquia do Senhor Bom Jesus do Livramento

 

"Estoria" da Imagem do Senhor Bom Jesus do Livramento

Texto  de  um artigo  de Carlos da Silva  Araujo “Jornal do Comercio” -  RJ – junho/1948

(conservando a estória e linguagem da época)

    Há mais de duzentos e cinquenta anos era já relativamente grande o tráfego de homens de outras terras por aquelas serranias alcantiladas e selvagens, onde o gentio bruto de parceria com a natureza de ferocidade incomparável fazia ao forasteiro intrépido, mas inexperiente, armadilhas as mais inesperadas. Assim se apresentava aos europeus, aos seus filhos nascidos no litoral sul-americano e aos africanos que traziam como escravos a barreira desmensuradamente elevada entre sua ambição poderosa e as promessas de fortuna aurífera do sertão bravio acenavam à cupidicência dos invasores. Eram as grimpas mais orientais do imenso e polibraquial maciço a que chamaram: " A Mantiqueira". Os divisores de águas que corriam para o sul e para o leste, das que desciam com o rumo oposto: nórdico ocidental. Da vertente austro-oriental do Itatiaia, já melhor conhecida, drenada no Paraíba, passavam as cabeceiras e nascentes dos cursos d'água que iriam formar o Rio Grande.  As bocainas de longe lobrigadas nos pontos menos elevados das cadeias de cumes rochosos e eretos, davam o rumo  às marchas e derrotas. Buscavam-nas pelos vales imensos e ferozes, tendo os cursos d'água por linhas de acesso. Por vezes nomeadas: Embaú, Passa-Quatro, Picu, Passa-Vinte... Outras ficaram apenas com o nome comum do fato geográfico elevado a topônimo. A inicial minúscula fez-se B maiúsculo. Mais de uma assim conhecidas até nossos dias. Entre essas, a que está vizinha a Passa-Vinte. Hoje, desde 1923 chama-se Liberdade a antiga paróquia do Senhor Bom Jesus do Livramento, elevada a freguesia em 1855. A velha paróquia pertencera em tempos idos à Comarca de Turvo de Barbacena. Depois, no regime monárquico, a freguesia esteve subordinada à Comarca de Itatiaia, transformada pela República em Município de Aiuruoca. Livramento foi distrito desse Município até 1939, ano em que passou a ser sede do Município de Liberdade. A Cia. de Níquel do Brasil foi a causa de um surto de relativo progresso que há poucos anos teve a localidade. É que, possuindo o município imensa jazida mineral de níquel, dita a segunda do mundo em volume de minério, no morro chamado do Corisco, pela observação popular da preferência das faíscas elétricas pelas sua terras sáfaras, ali se instalou a Companhia, com fornos de alta tensão e produção, pelas técnicas mais modernas, baseadas na eletrólise, da média diária de uma tonelada de ferro-níquel. Foi ainda nos dias difíceis do século XVIII, na época da mineração, que nasceu o arraial montanhês. Muitas eram as aflições que atormentavam sua população. A fé católica a confortava. Já se tinha erigido uma ermida. Ansiava a população dotá-la de imagem condigna do Senhor Bom Jesus, a cuja divina proteção recorria em transes dolorosos e horas de aflição. Não era fácil, porém, obtê-la. Estavam assim os habitantes acariciando a devota aspiração quando, certo dia, surgiu no arraial a figura estranha de velho peregrino, de todos inteiramente desconhecida. Ninguém sabia de onde viera, que rumos e propósitos trazia.  Inteirou-se o estranho do desejo dos fieis de Livramento e propôs-se a executar a imagem. Indagou-se do preço e das condições em que faria seu trabalho.
    A primeira questão, respondeu o visitante encanecido que não merecia consideração. Realizado o trabalho, conforme o êxito da empresa, remunerá-lo-iam como bem entendessem. Quanto ao mais reclamava um lenho de lei, a ferramenta ordinária de carpintaria e um compartimento fechado, onde pudesse trabalhar tranquilo, a sós, fora das vistas de qualquer pessoa. Embora um tanto estranha parecesse a condição derradeira, como eram fáceis as demais, acordaram-se aos seus desejos.
    A uns cinco quilômetros de distância, na Fazenda da Covanca, opinou alguém, havia o madeiro mais adequado à obra. Era uma grande árvore que, por mais de uma vez já tinha resistido às fogueiras das queimadas feitas para o plantio de roças ou de queima anual dos pastos. Parecia até um milagre, o fogo ardia impiedoso ao redor dela, aviventado pelas rajadas de vento serrano, devorando tudo, mas quando se aproximava do tronco magnífico sob a ramagem luxuriante, aplacava-se e consumia-se sem molestar sequer de leve a verde folhagem do gigante vegetal. Foram buscá-lo. Derrubada a grande árvore e  carregada para junto da capela, colocaram o tronco em compartimento à mesma anexo e supriram ao velho de ferramentas.Conforme o estipulado, afastaram-se todos e o homem encerrou-se  na oficina improvisada. Passou-se o primeiro dia. Outro sol nasceu, brilhou e mergulhou na linha do horizonte. Nenhum sinal de si dava o obreiro estranho. Nada pedira, nem água ou alimentos reclamara. No terceiro dia, os comentários tomavam vulto. Aproximaram-se alguns homens do quarto onde o homem se encerrara. Apuraram-se oiças, nenhum ruído vinha de lá. Chamou-se. Bateu-se. Nenhuma resposta. "Morreu, decerto o homem", opinou alguém. Consultou-se o Vigário. Parlamentaram os maiorais da modesta coletividade. Assentou-se que, na conjuntura, não importava em quebra do tratado arrombar a porta para ver o que corria. Assim foi feito. E, então, estupefação geral: ninguém havia no compartimento, mas no centro do quarto vazio estava, no tamanho natural de um homem, com a mais consternada expressão fisionômica de dor, belíssima imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo. Desde logo caíram genuflexos e contritos os pesquisadores. Era um milagre! Um grande milagre aquela imagem tão perfeita e inteiriça, saída de um lenho bruto, trabalhado com ferramentas tão sumárias, pelas mãos nodosas de um velho.  Um velho? Sim, um velho! Que era dele? Onde fora! Quem era! De onde viera? Despacharam-se correios em busca por todos os caminhos. Sentinelas permaneceram em todos os passos e encruzilhadas. Procurou-se em todos os rumos. Indagou-se em todas as portas. Nas fazendas, nos ranchos, e nos pousos de tropeiros. Devassaram-se todos os cantos possíveis. Atentou-se no vôo dos abutres necrófagos, admitindo-se a hipótese da morte do retirante. Nada.  Baldadas quaisquer diligências.  _ São José!  disse alguém. _ Sim!  São José, repetiam e concordavam todos. Não havia dúvidas. Aquela mansidão. Aquela doce fisionomia. A rala barba branca, São José, o divino carpinteiro, esposo eleito da Santa Virgem, doara à gente simples e crente de Livramento aquela soberba Imagem.

 

Fonte: (Paróquia do Senhor Bom Jesus do Livramento)
(Texto de um artigo de Carlos da Silva  Araujo "Jornal do Comercio” - RJ – 06/1948)